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O Masculino Profundo


imagem cedida pelo Unsplash

Chegamos ao portal do Masculino Profundo. E quem se apresenta é o Xamã-Malandro, que desde o início esteve presente, ainda que não tenha se mostrado por inteiro.

Ao longo das duas temporadas de nossa saga, a Alma e sua Práxis no Mundo e o Homem em Busca do Masculino Profundo, ele deu indícios que a nossa trajetória vai em direção ao resgate da nossa imagem masculina mais primeva -, aquela que temos procurado tirar da clandestinidade e da luta cristalizada entre os heróis e os patriarcas.

No início, ele nos mostrou que quanto mais rígida a nossa estrutura, mais os talentos tendem ir para as sombras, preferindo o papel de infratores que quebram regras para escapar dessas repetidas cenas de bravura e poder aos quais nós somos submetidos cotidianamente. E que para empreender transformações verdadeiras, é preciso que a nossa alma se liberte desses modelos padronizados e encontre a energia criativa primordial - em grego, το αρχέτυπο φως -, Luz arquetípica, Luz divina ou Deus da Criação. Para isso, precisamos estar em sintonia com o que somos, cultivando uma prática viva, em movimento.

Não é isso o que temos buscado o tempo todo quando nos rebelamos de alguma forma?

Ou que saímos em busca de algo que nos mobilize por completo e nos tire de nossa zona de conforto?

A essência do Xamã-Malandro é a de integrar aspectos e impulsos contraditórios que não nos fazem menos homens. Muito pelo contrário. Ele mostra as suas facetas, quando, no dia a dia, saímos do modus operandi que nos foi dado como certo, ou seja, quando nos reinventamos acolhendo um novo jeito de fazer ou nos posicionamos num lugar diferente daquele que nos foi reservado.

Batizado de Trickster, Saci Pererê, Mercurio ele é conhecido como o deus das trapaças e das engenhosidades, é parte animal, parte homem, parte espiritual. Aprendeu a dançar antes mesmo de dominar a arte de lutar, deixando vestígios em grandes reis como Hermes, Hefesto e Dionísio, e até mesmo no Espírito Santo. Ele é o mais antigo dos arquétipos: o único a conseguir a façanha de integrar os seus opostos, na medida em que admite sua fragilidade, mas reconhece sua força.

Ao longo da nossa vida de homens, ele aparece e desaparece várias vezes. Está presente, por exemplo, na nossa primeira experiência masculina arquetípica, através da figura do pai que é sinônimo de divertimento, emoções e de situações desafiadoras para nós filhos – também o encarnamos para os nossos próprios filhos.

É bastante familiar aos 4 ou 5 anos, e ainda quando somos jovens e pegamos ondas de energias sexuais ou somos temperamentais e impulsivos como ele.

Na idade adulta, porém, o Xamã-Malandro some, já que não cabe nos arquétipos dos heróis e dos patriarcas que canalizam a energia para a construção da carreira e da família. E na maturidade ele volta com força redobrada: é a fase em que precisamos tirar da cartola aquilo que ficou reprimido ao longo da vida para darmos início ao caminho da individuação, rumo à totalidade.

Além da sua importância inquestionável no folclore e na mitologia, o Xamã-Malandro é também o fundador da civilização humana no sentido psicológico --, ao lado dos símbolos e da linguagem para a consciência e a cultura. Serve de mediador entre o consciente e o inconsciente (psicopompo) e possibilita o confronto entre os nossos aspectos sombrios e destrutivos, emergindo nos sonhos de maneira simbólica e desconcertante, conforme pontua Allan Chinen em “Além do Herói – histórias clássicas de homens em busca da alma”.

É natural, portanto, que como nosso mestre de cerimônias, ele nos convide a cruzar o portal do masculino profundo que se abre novamente quando nós homens abandonamos a trilha do herói ou do patriarca e nos desprendemos do visgo da alma -- lugar onde muita gente estaciona --, reconhecendo nossas Animas e Sombras.

Você tem ideia do papel do masculino no mundo de hoje ou de onde esse resgate pode nos levar?

Se sente confortável com o seu próprio papel?

Sua alma está feliz?

O Xamã-Malandro é o próprio masculino profundo, representa a liberdade e o processo de criação simbólica. Em seu contexto há alegria, criatividade, generosidade; há uma volta à impetuosidade juvenil. Ele é curioso, não vê estranhos como inimigos, competidores ou rivais. Cultiva amigos, é parceiro das mulheres, tem profundo respeito pelos animais e só tira da natureza dando algo em troca.

No caminho que ele nos propõe é possível reintegrar conteúdos que nos tornem mais criativos para encarar a vida individual e coletivamente e fazer frente à esse momento da humanidade. Por isso temos feito downloads constantes de um inconsciente coletivo que também se mostra distinto e mais desafiador do que conhecíamos até agora.

E saiba, não estamos sozinhos. Rebeliões de xamã-malandros acontecem ao redor do mundo, algumas mais silenciosas do que outras, indicando que somente poderemos abrir novas trajetórias, na medida em que reconhecermos as limitações do presente, daí porque retornar às nossas origens para buscar outras vestimentas e trilhas, é parte de nossas novas jornadas.

Reconhecer o Xamã-Malandro que há em todos nós é trabalhar pela cura de doenças, pela promoção da troca de ideias e experiências, é acolher opostos e não ter medo de se olhar como um todo e para dentro. Mas não é preciso inventar nada de novo. A questão é recuperar a essência da psique masculina abandonada há muito tempo, mas que sobrevive em sonhos e nas histórias transmitidas de geração em geração, parando de ignorar os signos e sinais que têm sido cada vez mais insistentes, em termos do que poderíamos somar em sabedoria se pegamos o caminho da totalidade.

É aí, vamos aceitar o convite do Xamã-Malandro?

Vamos juntos?


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